dc.description.abstract |
Este trabalho explora a ideia de apropriação dos espaços públicos da cidade contemporânea a partir do cotidiano de atores sociais envolvidos no processo de uso e produção desses espaços. Abordamos, para tanto, diferentes tempos na construção da cidade. Primeiro a partir da sedimentação de determinações e estratégias político-econômicas expressas na visão e nas ações institucionais do planejamento e projetos urbanos. Esta abordagem, realizada junto à cidade de Santa Maria, possibilitou que nos deparássemos com a atual fragmentação dos seus espaços públicos centrais, particularmente no caso dos recortes espaciais então denominados de "centro" e "borda". Na busca por compreender o fenômeno, identificamos parâmetros tais como a evolução e a dispersão espacial da malha urbana, a localização na estrutura urbana dos recortes em questão e a dinâmica das atividades e fluxos urbanos como fatores intervenientes para a qualidade da centralidade. Mas também foram consideradas, a fim de que também consubstanciassem a relação de interdependência que há entre os atributos formais em suas diversas escalas espaciais, as ambiências dos espaços públicos centrais configuradas a partir dos usos que as engendram. Em um segundo momento, a partir de uma avaliação crítica do saber-fazer urbanístico, nos lançamos num outro modo de apreensão da cidade - o qual denominamos "nômade" e capaz de encarar a circunstancialidade dos acontecimentos observados. Para tanto, o movimento do pesquisador, o qual se mostrou "caminhante", deu-se a partir de inserções corpóreo-motoras e sensíveis nos espaços públicos, assim como na observação das práticas dos sujeitos ordinários - indivíduos que trabalham, habitam, se expressam ou simplesmente se deslocam pelas ruas e praças da centralidade (espaços-centro) ou pelo abandono dos espaços ferroviários (espaços-borda) da área central de Santa Maria. Eles foram tomados como objetos de destaque da pesquisa. Em campo e no dia a dia, o pesquisador-caminhante, ao nível do chão, deixou-se afetar, assim como ajudou a conformar, pelas ambiências, corpos e modos de usar empreendidos pelos cidadãos. A definição do campo de investigação, considerada mediante os recortes "centro" e "borda", decorreu da experiência do pesquisador junto a lugares do encontro - no caso das apropriações regulares que as continuidades, permanências e os fluxos do cotidiano propiciam - e também da alteridade - no caso das apropriações ocasionais que a indeterminação funcional possibilita - a fim de trazer à tona as forças variadas que povoam os processos urbanos contemporâneos. Deste modo, foi preciso considerar o tempo de decurso das práticas, as táticas dos modos de ocupar o espaço, a lentidão ou aceleração das diversas trajetórias, tudo isto a configurar "estados urbanos" desacelerados ou instauradores de potencialidades criativas os quais são expressos nos usos e na significação dos espaços públicos. As circunstâncias que abordamos, sobretudo a potência micropolítica e criativa dos espaços-borda, conferem especificidade às experiências vivenciadas, o que é próprio à complexidade da cidade e provoca a flexibilização, primeiro da postura e, segundo, do aparato projetual do arquiteto urbanista. O trabalho empreendeu então um percurso teórico e prático, resultando num modo de ver a cidade a partir do movimento do pesquisador, mas também numa ferramenta metodológica, que aos poucos se revelou como um modo vivenciado de fazer o urbanismo. As narrativas urbanas então desenvolvidas deflagraram reflexões para além de paradigmas técnico-científicos, mas a respeito dos desafios éticos, estéticos e políticos do campo disciplinar urbanístico.<br> |
pt_BR |