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No semestre de 2008.2 estive num programa de intercâmbio acadêmico na New York University (Tisch School of the Arts). Como tenho o hábito de sempre portar uma câmera, seja fotográfica ou filmadora, acumulei um acervo de imagens e vídeos. Este material foi captado aleatoriamente, desvinculando de um projeto prévio ou mesmo de qualquer esboço de projeto que pudesse vir a ser elaborado. Filmei indistintivamente coisas que capturaram minha atenção, e outras tantas como exercício de combate ao tédio (uma forma de passar o tempo em um translado lento ou num evento chato). Também filmei como vingança, para futuramente constranger bêbados que me acordaram de madrugada na moradia universitária. Também como um turista, durante pequenos passeios, e para registrar detalhes cotidianos de que eu gostaria de me lembrar. Às vezes, simplesmente filmei em resposta a uma indicação (alguém perguntando se eu tinha interesse em gravar um protesto na biblioteca, ou meu pai querendo saber da agitação em torno da campanha eleitoral de Obama, àquela altura em plena efervescência). Isso não significa que eu não tivesse consciência do que poderia vir a fazer um documentário com esse material. O que explica a existência dos relatos, por exemplo. São momentos que não existiriam se não houvesse a alternativa de um filme no horizonte. Assim, não me limitei só a gravar espontaneamente o que surgisse, mas criei deliberadamente certas situações. Vale notar que a ausência de qualquer projeto, método, dispositivo, ao me colocar aberto a gravar qualquer coisa de qualquer jeito e por qualquer motivo, não resultou numa profusão de imagens e num volume descontrolado de material. Pelo contrário, ao final dos quatro meses me vi com apenas nove fitas, das quais metade estavam incompletas. Ao todo capturei menos de 5 horas de imagens das fitas para a edição. Me surpreendi como da falta de estrutura, definição de temas, reflexão sobre questões estéticas ou de abordagem, pôde resultar uma maior seletividade (quando muitas coisas estão definidas, talvez seja fácil ver potencial em todo lugar, além de se perseguir imagens que condizem com as ideias previamente estabelecidas). A minha relação com a produção de imagens se aproxima de cineastas como Jem Cohen, dentro de uma perspectiva de "cinema autônomo", afastado do modus operandi mais tradicional no cinema documentário. Trata-se de um filme sem verba e sem equipe, captado e montado por uma só pessoa, produto de uma vivência e não de um cronograma de produção - em seu processo, vale a ideia de um "cameraman peripatétco", que se reflete sobre o mundo a medida que o percorre com a câmera no seu dia-adia. Outro efeito desse modo de filmar, associado à minha condiçào de viajante, é de uma espécie de ausência de hierarquia (em que tudo pode ser maarcante, "interessante"). Deste modo, por exemplo, o filme dedica o mesmo tempo às imagens da vitória de Obama quanto àquelas de uma noite na cozinha do alojamento universitário, como colegas bêbados. A narração, ensaística, varia do comentário político à reflexão íntima. O ensaio é frequentemente definido como escrita fundada num sujeito, algo que pode servir tanto para descrever a minha captação de imagens quanto a redação das diferentes vozes que narram esse filme (e, é claro a escrita deste memorial). |
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