Atividade física, aptidão aeróbica e risco de doença cardiovascular em crianças e adolescentes que vivem com HIV: estudo "Saúde PositHIVa"

Abstract

Este estudo teve como objetivo analisar a atividade física, aptidão aeróbica e o risco de doença cardiovascular de crianças e adolescentes que vivem com o vírus da imunodeficiência humana (HIV) e um grupo de controles (sem diagnóstico de HIV). A pesquisa, do tipo transversal, foi desenvolvida de novembro/2015 a setembro/2016 em Florianópolis, Brasil. A amostra foi composta por 130 crianças e adolescentes (53,8% meninas) de oito a 15 anos, divididas em grupo HIV (n = 65) e controle (n = 65). A atividade física de intensidade moderada à vigorosa (AFMV) foi mensurada por acelerômetros por, no mínimo, quatro dias. A aptidão aeróbica foi expressa pelo consumo pico de oxigênio (VO2 pico), que foi mensurado pela análise da troca de gases expirados em teste incremental máximo em cicloergômetro. O risco de doença cardiovascular foi caracterizado pela medida da gordura corporal total e do tronco, pressão arterial, colesterol total e frações HDL-c e LDL-c, triglicerídeos, glicose, insulina, proteína C-reativa (PCR), interleucina (IL)-6, fator de necrose tumoral-alfa (TNF-a) e espessura médio-intimal carotídea (EMIc). Participantes do grupo HIV demonstraram menor VO2 pico (39,2 vs. 44,5 ml.kg-1.min-1) e blocos contínuos de cinco (19,7 vs. 26,6) e 10 minutos (3,6 vs. 5,8) de AFMV comparados ao grupo controle. Participantes do grupo HIV sem uso de terapia antirretroviral demonstraram menor VO2 pico (ß = -8,529). O grupo HIV quando comparado ao controle demonstrou maior concentração de glicose (87,9 vs. 75,9 mg.dL-1), LDL-c (94,7 vs. 79,5 mg.dL-1), triglicerídeos (101,2 vs. 61,6 mg.dL-1), PCR (1,6 vs. 1,0 mg.L-1), IL-6 (1,42 vs. 0,01 pg.mL-1), TNF-a (0,49 vs. 0,01 pg.mL-1) e EMIc (0,526 vs. 0,490 mm) e menor HDL-c (53,7 vs. 69,4 mg.dL-1). As alterações clínicas mais significativas foram associadas aos participantes com HIV em uso de inibidores de protease na terapia antirretroviral, como o maior HOMA-IR (ß = 0,359), colesterol total (ß = 18,428), LDL-c (ß = 22,352), triglicerídeos (ß = 0,679), PCR (ß = 0,354) e EMIc (ß = 0,056). Porém, independente do uso de terapia antirretroviral, crianças e adolescentes que vivem com HIV demonstraram maior IL-6 e menor HDL-c comparado aos controles. Verificou-se no grupo HIV que os maiores níveis de AFMV foram inversamente associados à gordura corporal total (ß = -3,566), do tronco (ß = -3,495), colesterol total (ß = -0,112) e LDL-c (ß = -0,830). Similarmente, o maior VO2 pico foi associado à menor gordura corporal total (ß = 0,629), do tronco (ß = 0,592) e PCR (ß = -0,059). Participantes que vivem com HIV e ?fisicamente ativos? demonstraram menores valores de colesterol total e LDL-c (-24,4 e -20,1 mg.dL-1, respectivamente) comparado aos pares ?insuficientemente ativos?. Assim como participantes com HIV e ?aptidão aeróbica satisfatória? mostraram menor gordura corporal total e do tronco (-4,1 e 4,3%, respectivamente) e menor concentração de PCR (-2,3 mg.L-1), IL-6 (-2,4 pg.mL-1), TNF-a (-1,0 pg.mL-1) comparado aos pares com ?baixa aptidão aeróbica?. Conclui-se que: 1) aptidão aeróbica e blocos de AFMV estão reduzidos em crianças e adolescentes que vivem com HIV comparado aos controles; 2) inflamação crônica de baixo grau, dislipidemia, resistência à insulina e maior EMIc representam maior risco de doença cardiovascular crianças e adolescentes que vivem com HIV; 3) níveis elevados de AFMV e aptidão aeróbia foram associados à menor concentração de lipoproteínas e de mediadores de inflamação crônica de baixo grau, respectivamente, e simultaneamente associados aos menores valores de gordura corporal. As associações encontradas sugerem um potencial da atividade física com intensidade suficiente para aprimorar a aptidão aeróbica em mitigar o risco cardiovascular em crianças e adolescentes vivendo com HIV.

Abstract : This study aimed to analyze the physical activity, aerobic fitness and risk of cardiovascular disease in children and adolescents living with human immunodeficiency virus (HIV) and a group of controls (without HIV diagnosis). The cross-sectional research was developed from November / 2015 to September / 2016 in Florianópolis, Brazil. The sample consisted of 130 children and adolescents (53.8% girls) aged 8 to 15 years, distributed into HIV (n = 65) and control (n = 65) groups. Moderate to vigorous physical activity (MVPA) was measured by accelerometers for at least four days. Aerobic fitness was expressed by the peak oxygen consumption (peak VO2), measured by the analysis breath-by-breath respiratory exchange in a maximal incremental test in cycle ergometer. Risk of cardiovascular disease was characterized by the measurement of total and trunk body fat, blood pressure, total cholesterol and fractions (HDL-c and LDL-c), triglycerides, glucose, insulin, C-reactive protein (CRP), interleukin (IL)-6, tumor necrosis factor-alpha (TNF-a) and carotid intima-media thickness (IMTc). Participants of the HIV group showed lower peak VO2 (39.2 vs. 44.5 ml.kg-1.min-1) and bouts of 5 (19.7 vs. 26.6), and 10 minutes (3.6 vs. 5.8) of MVPA compared to the control group. Participants in the HIV group without antiretroviral therapy showed lower peak VO2 (ß = -8,529). The HIV group also showed a higher concentration of glucose (87.9 vs. 75.9 mg.dL-1), LDL-c (94.7 vs. 79.5 mg.dL-1), triglycerides (101.2 vs. 61.6 mg.dL-1), CRP (1.6 vs. 1.0 mg.L-1), IL-6 (1.42 vs. 0.01 pg.mL-1), TNF-a (0.49 vs. 0.01 pg.mL-1) and IMTc (0.526 vs. 0.490 mm), and lower HDL-c (53.7 vs. 69.4 mg.dL-1) compared to the controls. The meaningful clinical changes were associated with HIV-infected participants in use of protease inhibitors on antiretroviral therapy, such as higher HOMA-IR (ß = 0.359), total cholesterol (ß = 18.428), LDL-c (ß = 22.352), triglycerides (ß = 0.679), PCR (ß = 0.354), and IMTc (ß = 0.056). However, regardless of antiretroviral therapy, children and adolescents living with HIV demonstrated higher IL-6 and lower HDL-c compared to controls. It was found in the HIV group that the highest levels of MVPA were inversely associated with total (ß = -3.566) and trunk body fat (ß = -3.495), total cholesterol (ß = -0.112), and LDL-c (ß = -0.830). Similarly, the highest peak VO2 was associated with the lowest total (ß = 0.629) and trunk body fat (ß = 0.592), and CRP (ß = -0.059). Participants living with HIV "physically active" showed lower values for total cholesterol and LDL-c (-24.4 and -20.1 mg.dL-1, respectively) compared to "insufficiently active" pairs. Furthermore, HIV-infected participants with ?satisfactory aerobic fitness? showed lower total and trunk body fat (-4.1 and 4.3%, respectively) and lower concentration of CRP (-2.3 mg.L-1), IL-6 (-2.4 pg.mL-1), TNF-a (-1.0 pg.mL-1) compared to pairs with ?low aerobic fitness?. We conclude that: 1) aerobic fitness and bouts of MVPA are reduced in children and adolescents living with HIV compared to controls; 2) low-grade chronic inflammation, dyslipidemia, insulin resistance and higher IMTc, represent a higher risk of cardiovascular disease children and adolescents living with HIV; 3) high levels of MVPA and aerobic fitness were associated with lower concentration of lipoproteins and mediators of chronic low-grade inflammation, respectively, and simultaneously associated with lower values of body fat. The associations found suggest the potential of physical activity with sufficient intensity to improve aerobic fitness in mitigate cardiovascular risk in children and adolescents living with HIV.