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A crítica como tarefa acadêmica Para pensar a crítica de mídia há incontáveis perguntas na busca de respostas que deem conta da complexidade e necessidade desta tarefa. Pode-se perguntar sobre as naturezas da crítica de mídia, os lugares onde se encontram, quais sujeitos a praticam, que diferenças há entre análise e crítica de mídia, quais as perspectivas teóricas que as orientam. A partir da variedade de indagações se abrem as possibilidades, igualmente diversas, de se estudar a crítica de mídia em diferentes instâncias ou modalidades: a) na percepção de parâmetros, do “como fazer para criticar”, observando a operacionalizaçãodo ofício do crítico e, quando no campo do jornalismo, com atenção para implicações éticas e estéticas da cobertura dos acontecimentos noticiados; b) no estudo das críticas de mídia que circulam pela própria mídia, feitas por aqueles especialistas reconhecidos como críticos, ou seja, que possuem saberes que o público não domina. c) na crítica de mídia como um gênero textual, praticado pelos especialistas a partir de determinadas convenções reconhecidas pelo público, possibilitando sua circulação junto a ele em espaços já institucionalizados, como jornais, revistas, blogs, entre outros. d) nas experiências metacríticas, em termos de conteúdo e forma, das inovações estéticas e estilísticas veiculadas na própria mídia, que, ao propor um novo formato ou gênero, empreendem uma crítica àquilo estabelecido como padrão, realizando-a não como uma análise sobre a mídia, mas no próprio fazer midiático; e) nos modos de leitura e perfis do público de crítica de mídia; f) nas interações sociais de crítica, nas quais receptores criticam de maneira dispersa e informal materiais veiculados nas mídias, não apenas questionando fundamentos da produção midiática como, principalmente, marcando lutas identitárias e disputas por hegemonia e reconhecimento; g) no estudo das “teorias da crítica”, teorizando sobre os modos de “como criticam os que criticam” e de “como fazer para criticar” e h) na crítica de mídia noticiosa como recurso didático-pedagógico para ensino e formação de profissionais, como jornalistas, por exemplo, e para o trabalho de formação de leitores críticos de produtos midiáticos. Neste simpósio promovido pelo Grupo de Pesquisa Crítica de Mídia e Práticas Culturais, na Universidade Federal de Santa Catarina, alguns pesquisadores da área da Comunicação se dedicam a discutir questões em torno da seguinte pergunta: como criticam os que criticam? As disposições de pesquisadoras e pesquisadores se complementam pelo esforço em trabalhar por diferentes perspectivas teóricas de críticas, pensar a crítica de instituições e processos midiáticos de modo mais geral, fazer o exercício de crítica de objetos midiáticos particulares – com destaque para os do campo do Jornalismo – e de objetos midiáticos que se mostram críticos em si mesmos. Para além de possíveis respostas sobre os modos de se fazer a crítica de mídia, tais estudos trazem novas perguntas e problemas. As apresentações se iniciam buscando desdobramentos teóricos abertos e atuais para a abordagem crítica. Em “Transformações e atualidade da teoria crítica”, Vera Veiga França (UFMG) avalia o comprometimento da mídia com o interesse coletivo e com a justiça social, realizando uma recuperação de importantes matrizes da teoria crítica e seus desdobramentos para os estudos da comunicação. José Luiz Aidar Prado (PUC-SP), em “Crítica de mídia em perspectiva aberta”, examina o tema da polarização pós 2013 no Brasil a partir da questão dos afetos, situando a crítica a partir de distintas correntes teóricas. Rogério Christofoletti (UFSC) preocupa-se com a ética jornalística e a crítica de mídia em “Padrões de manipulação no jornalismo brasileiro: fake news e a crítica de Perseu Abramo 30 anos depois”, sugerindo alguns avanços nas proposições do autor, especialmente em face dos fenômenos da pós-verdade e das chamadas fake news. Em “Acontecimento e problemas públicos: elementos para uma crítica de cobertura jornalística”, Terezinha da Silva (UFSC) analisa a cobertura que as revistas Veja e Carta Capital realizaram da delação de executivos da Odebrecht na Operação Lava Jato fazendo a crítica da cobertura jornalística na percepção do acontecimento. A recuperação de dados advindos da publicação de conteúdo jornalístico publicado nos meios digitais enseja uma crítica de mídia de maneira extensiva e ampliada. Em “Análise crítica de portais especializados em cobertura meteorológica”, María Luísa Sánchez (Universidad Complutense de Madrid) investiga tendências e posicionamentos da informação meteorológica em portais especializados. E em “Etnografia como abordagem teórico-metodológica em estudos de crítica de mídia”, Lívia de Souza Vieira (UFSC) propõe a utilização da etnografia baseada na teoria ator-rede, de Bruno Latour, para os estudos de newsmaking. Pensando a crítica de maneira estendida, nas abordagens possíveis entre a tomada artística e ficcional de diferentes narrativas, Thiago Venanzoni (USP), em “Modos de narrar, formas de descrever: processos de (trans)crição de um corpo”, analisa três obras audiovisuais, recuperando descrições e narrações sobre corpos em disputa no campo político e suas formas de sociabilidade. Finalmente, em “Crítica de formatos digitais a partir de experiências em web arte”, Andrea Limberto recupera experiências da internet como ponto de partida para uma investigação sobre como o trabalho com recursos digitais tem informado criticamente os circuitos de produção midiática adotando, como estudo de caso, os trabalhos de Lucas Bambozzi e Fábio Fon. O evento conta ainda com a participação especial do crítico de cinema e tradutor José Geraldo Couto, que, a partir da ideia de “Crítica do juízo, juízo da crítica”, discute questões como a relevância da crítica, a dimensão criativa e especializada da tarefa do crítico, as pressões do mercado, a proliferação de espaços novos de crítica na internet e a política tratada em aspectos cinematográficos. Temos, então, neste I Simpósio de Crítica de Mídia – como criticam os que criticam? tanto exercícios de crítica, em trabalhos que tratam de objetos/práticas midiáticas, como de metacrítica, nos trabalhos em perspectiva teórica e reflexiva. Os pesquisadores se dispõem, cada um à sua maneira, a observar objetos concretos/empíricos (produtos, processos e discursos) efetivamente em circulação nas mídias, a estudar algumas condições de produção e a problematizar a finalidade política da crítica. Juntos, assumem a responsabilidade e a urgência de tomar a crítica de mídia como uma tarefa acadêmica. Gislene Silva Rosana de Lima Soares Setembro de 2017 / UFSC |
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