Os falatórios de Stella do Patrocínio: sexualidades e processos de subjetivação no contexto manicomial

Abstract

No contexto atual de retrocessos no campo da saúde mental e dos direitos sexuais e direitos reprodutivos, os falatórios poéticos de Stella do Patrocínio ecoam como registros de um passado manicomial que insiste em retornar. Stella do Patrocínio tem sua história marcada por trinta anos de institucionalização em um hospital psiquiátrico, onde conseguiu elaborar falatórios poéticos que posteriormente foram gravados e transcritos no livro ?Reino dos Bichos e dos Animais é o Meu nome? (2001). O objetivo desta dissertação é problematizar os falatórios de Stella do Patrocínio, no que se refere às sexualidades. A partir de um diálogo interseccional, tais falatórios permitiram ver uma sexualidade associada a enquadramentos normativos de gênero, raça e classe e seus efeitos nos processos de subjetivação, e no estatuto ontológico que torna determinados corpos, como o de Stella, abjetos e não passíveis de luto. Além disso, foi evidente não só a articulação entre a lógica asilar, a biopolítica e a eugenia com os saberes e práticas das ciências psis que tendem a tutela e normalização das sexualidades, como também a articulação entre o sistema manicomial e o sistema sexo-gênero colonial. Mesmo encarcerada, Stella nos permitiu ver vias de resistência às opressões que reverberam na atualidade.

Abstract: In the present context of setbacks in the fields of mental health and of sexual and reproductive rights, Stella do Patrocinio's poetic talks echoe as records of an asylum past that insists on coming back. Stella do Patrocinio's history is marked by thirty years of institutionalization in an asylum, where she managed to elaborate poetic talks that were later recorded and transcribed in the book ?Reino dos Bichos e dos animais é o meu nome? (2001). The objective of this dissertation is to problematize Stella do Patrocínio's talks about sexualities. From an intersectional dialogue, her talks allowed us to see a sexuality that is associated with normative frameworks of gender, race and class and their effects on the subjectivation processes and on the ontological status that makes certain bodies, such as Stella's, abject and not subject to mourning. In addition, it was evident, besides the articulation between the asylum logic, biopolitics and eugenics with the knowledge and practices of the psy?s sciences that tend to tutor and normatize sexualities, the articulation between the asylum system and the sex-gender colonial system. Even incarcerated, Stella allowed us to see ways of resisting the oppressions that reverberate today.