A imprensa do século XIX e o “Tribunal da Opinião Pública” sobre o crime de reduzir pessoa livre à escravidão (Pernambuco, século XIX)

Abstract

A imprensa no Brasil oitocentista noticiou com frequência casos de escravização ilegal de pessoas livres, crime definido pelo Art. 179 do Código Criminal de 1830. Pelo código, os responsáveis por escravizar ou reescravizar pessoas que eram livres ou libertas, seriam penalizados com prisão e multas. Os artigos publicados nos jornais da época tinham como objetivo informar, denunciar ou negar casos de escravização ilegal, buscando moldar na sociedade brasileira certas avaliações morais, individuais e coletivas que mostravam-se contra as práticas do crime e a favor da punição aos criminosos. Tendo isso em vista, a presente monografia realizada com o uso dos jornais disponíveis na Hemeroteca Digital Brasileira (BNDigital) permitiu analisar como os casos e as suspeitas de escravização e reescravização ilegais foram discutidos na imprensa de Pernambuco, entre os anos de 1830 e 1880. A metodologia empregada categorizou os artigos selecionados em três tipos principais: "notícias" (informativas), "denúncias" (contra escravizações ilegais ou suspeitas de tal) e "defesas" (dos direitos de propriedade e da imagem social dos acusados ou dos denunciantes). Essa classificação permitiu observar que a imprensa oitocentista foi utilizada como um "Tribunal da Opinião Pública" com intuito de expor e denunciar escravizadores, defender os direitos dos escravizados, debater as leis sobre escravidão e liberdade, e justificar a propriedade e a inocência de alguns senhores de escravos. Para isso, foram analisados os artigos dos noticiários e das seções de correspondências, “solicitadas” e dos “a pedidos” dos jornais de Pernambuco. Assim, ao utilizar da abordagem da microanálise para destacar que a imprensa do século XIX foi uma plataforma central de discussão das complexidades e controvérsias da escravização ilegal no Brasil, principalmente de africanos e afrodescendentes, pôde-se concluir que ao longo de várias edições e títulos de jornais, diferentes visões e “opiniões” sobre o crime apareceram, ora em diálogo, ora em confronto, expondo os diferentes caminhos do crime de escravização e os reflexos desse fenômeno para a sociedade pernambucana e brasileira.