Concepções de profissionais de saúde frente às ações de saúde mental desenvolvidas na Atenção Primária à Saúde

Abstract

As concepções da loucura modificaram-se ao longo do tempo, considerando crenças mágico- religiosas, médico-morais e culturais. No Brasil, a transformação na abordagem de saúde mental começou em 1970, consolidando-se com a Lei n. 10.216/2001 em 2001. Essa legislação promoveu a substituição gradual dos manicômios por serviços substitutivos de base territorial, como a Atenção Primária à Saúde (APS), facilitando a proximidade entre profissionais e usuários, fortalecendo vínculos e possibilitando intervenções específicas em saúde mental. A colaboração interprofissional na APS contribui para uma compreensão abrangente do usuário e cuidados de longo prazo centrados no paciente. O objetivo geral deste estudo foi analisar as concepções de profissionais de saúde frente às ações de saúde mental desenvolvidas em um Centro de Saúde (CS) da APS de uma capital do Sul do país. Trata-se de um estudo qualitativo, do tipo narrativo, realizado com profissionais de saúde atuantes em um CS da APS. Foram incluídos no estudo: profissionais de saúde de nível superior inseridos nesse CS. Quanto aos critérios de exclusão, excluíram-se: profissionais residentes ou outros profissionais que estivessem de férias ou afastados. A coleta de dados ocorreu entre outubro e novembro de 2023. Os dados foram analisados de acordo com a análise das narrativas de Mario Cardano. Durante a análise de dados emergiram cinco categorias: concepções dos profissionais sobre o processo saúde-doença mental na APS; ações e práticas de saúde mental desenvolvidas pelos profissionais na APS; reconhecimento das potencialidades da APS no cuidado em saúde mental; fragilidades da rede na assistência em saúde mental e; conceito de interprofissionalidade para os profissionais de saúde da APS. Analisando as concepções dos profissionais frente ao processo saúde-doença mental evidenciou-se que os mesmos o veem como multifatorial, com o trabalho e as vulnerabilidades sociais como principais causas de adoecimento psíquico. Reconheceram a alta medicalização por falta de alternativas na rede, assim como a persistência da lógica de encaminhamentos. O acolhimento e a escuta ativa, a inserção de práticas integrativas complementares, a realização de grupos em saúde mental, as interconsultas, o cuidado compartilhado e as discussões de caso em reuniões de equipe foram relacionados a ações de saúde mental pertinentes na APS. As potencialidades da APS para o cuidado em saúde mental foram apontadas como o vínculo, a proximidade com o território e a longitudinalidade do cuidado. Enquanto, fragilidades como escassez de recursos humanos, estrutura física inadequada, falta de práticas de educação permanente, produtivismo e dificuldade em lidar com a saúde mental foram destacadas. A atuação interprofissional foi compreendida pela integração das competências de cada categoria profissional, resultando na construção de um entendimento coletivo acerca de uma determinada situação. Entende-se que as concepções dos profissionais de saúde são constituídas através de um conjunto de eventos que envolvem o histórico da assistência em saúde mental ao longo das décadas. Para superar as percepções relacionadas aos modelos da psiquiatria tradicional, sugere-se o incentivo às práticas de educação permanente constantes que abordem temas relacionados a essas demandas cotidianas dos profissionais, tendo a lógica da atenção psicossocial como norteadora do cuidado em saúde mental.