Avaliação quantitativa de risco microbiológico para o reciclo de esgotos tratados no cultivo de arroz irrigado

Abstract

Embora já existam projetos de reúso de efluentes implementados no Brasil, ainda há um grande potencial a ser explorado, principalmente na agricultura, setor que mais consome água no país. Apesar de seus benefícios, o reúso de esgotos tratados pode causar danos à saúde dependendo da qualidade do efluente e da sua finalidade de uso. Visto o grande consumo de água pela cultura de arroz e o seu potencial para o reúso, esta pesquisa tem como objetivo avaliar quantitativamente o risco microbiológico para a saúde dos agricultores no cultivo de arroz irrigado no Estado de Santa Catarina. A avaliação de risco analisou a exposição devido a atividade de caminhar dentro das arrozeiras para sua manutenção (Cenário A) e ao imergir as mãos nas quadras de arroz (Cenário B). Ainda, foram avaliados cenários sem (Cenário 1) e com reservação prévia (Cenário 2) do efluente tratado. O estudo foi feito utilizando dados monitorados de E. coli no efluente disponibilizados pela companhia de saneamento responsável pela Estações de Tratamento de Esgotos (ETEs). As rotas tecnológicas das ETEs selecionadas foram: Filtro Biológico Percolador com Tratamento Físico-Químico e Desinfeção (FPB+FQ+D), Lodos Ativados Aeração Prolongada (LAP) e Upflow Anaerobic Sludge Blanket com Biofiltro Aerado Submerso (UASB+BAS). Através das séries históricas dos efluentes de cada rota tecnológica foram caracterizadas curvas de distribuição de probabilidade. A quantificação do risco foi realizada para os patógenos Rotavírus, Campylobacter e Cryptosporidium utilizando o software @risk através de simulações de Monte Carlo com 10.000 iterações. O estudo indicou que a exposição ao caminhar dentro das arrozeiras e o patógeno Rotavírus representam, respectivamente, a atividade e o patógeno de maior risco para a prática do reuso na rizicultura. Com os resultados obtidos, conclui-se que a reservação prévia é uma estratégia importante para a mitigação dos riscos. Os resultados medianos de risco anual de infecção pelo Rotavírus para o cenário com reservação prévia e exposição ao caminhar nas arrozeiras (Cenário 2A) foram: 0,01% para a rota tecnológica FPB+FQ+D, 0,04% para LAP e 0,09% para UASB+BAS. Portanto, a única rota tecnológica com risco anual de infecção dentro dos limites aceitáveis pela OMS neste cenário é a rota FPB+FQ+D, que inclui uma etapa de desinfecção. No entanto, para o risco anual de infecção médio em todos os cenários estudados, o risco foi maior do que o considerado aceitável pela OMS, evidenciando uma grande variabilidade nos dados de concentração de E. coli no efluente tratado. Conclui-se que a desinfecção e a reservação prévia são etapas essenciais na implantação de ETEs que visem o reuso de efluentes na rizicultura. Além disso, o monitoramento contínuo e uma boa operação da ETE são cruciais para garantir maior segurança frente às variações na concentração de patógenos no efluente.

Abstract: In Brazil, although there are reuse projects implemented, there is still great potential to be explored, especially in agriculture, which is the sector that most consumes water in the country. Despite its benefits, the use of treated sewage can cause harm to human health, depending on the quality of the effluent and its intended use. Given the large water consumption by rice cultivation and its potential for reuse, this research aims to do a quantitative microbial risk assessment to evaluate the health risk of farmers in irrigated rice cultivation with treated wastewater in the State of Santa Catarina. The risk assessment analyzed exposure due to the activity of walking inside rice fields for maintenance (Scenario A) and immersing hands in rice paddies (Scenario B). Scenarios without (Scenario 1) and with prior reservation (Scenario 2) of the treated effluent were also evaluated. The study was conducted using monitored data of E. coli in the effluent provided by the sanitation company responsible for the Wastewater Treatment Plants (WWTPs). The technological routes of the selected WWTPs were: Trickling Filter with Physical-Chemical Treatment and Disinfection (FPB+FQ+D), Extended Aeration Activated Sludge (LAP), and Upflow Anaerobic Sludge Blanket with Submerged Aerated Biofilter (UASB+BAS). Through the historical series data of effluents from each technologie, probability distribution curves were characteristic. Risk quantification was carried out for the pathogens Rotavirus, Campylobacter and Cryptosporidium using the @risk software through Monte Carlo simulations with 10,000 iterations. The study indicated that exposure from walking within the rice paddies and the pathogen Rotavirus represent, respectively, the activity and pathogen with the highest risk for the practice of reuse in rice cultivation. With the results obtained, it is concluded that prior storage is an important strategy for risk mitigation. The median annual infection risk results for Rotavirus in the scenario with prior storage and exposure from walking in the rice paddies (Scenario 2A) were: 0.01% for the FPB+FQ+D technological route, 0.04% for LAP, and 0.09% for UASB+BAS. Therefore, the only technological route with an annual infection risk within the limits considered acceptable by the WHO in this scenario is the FPB+FQ+D route, which includes a disinfection step. However, for the average annual infection risk across all studied scenarios, the risk was higher than that considered acceptable by WHO, highlighting significant variability in the concentration data of E. coli in the treated effluent. It is concluded that disinfection and prior storage are essential steps in the implementation of WWTPs aimed at effluent reuse in rice cultivation. Additionally, continuous monitoring and proper operation of the WWTP are crucial to ensure greater safety against variations in pathogen concentration in the treated effluent.