Verdades em rede: exame das decisões do TSE sobre a desinformação eleitoral no Brasil

Abstract

A internet e os smartphones popularizados neste século conferiram as características de instantaneidade e ubiquidade à informação, permitindo que ela percorra o globo num átimo pelas vias digitais. Por esses mesmos canais, com velocidade e alcance similares, a desinformação, cujo exemplo moderno mais emblemático está vulgarizado na expressão inglesa ?fake news?, trafega sem atropelos e com poder para influenciar a política, o mercado, a cultura, a saúde e demais aspectos das relações humanas. Esse fenômeno, que pode ser traduzido como a possibilidade de compartilhar deliberadamente conteúdos falsos, tem acalorado as discussões a respeito de seu poder para direcionar o resultado das consultas populares periódicas (eleições, referendos e plebiscitos) nos estados democráticos, os limites da liberdade de expressão e a necessidade/oportunidade do controle e modulação da rede mundial de computadores. No recorte desta dissertação, foi examinada a atuação do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) diante do uso da desinformação para alteração do livre convencimento dos eleitores brasileiros. A pesquisa, feita a partir da análise das decisões proferidas pelo TSE, revelou que os magistrados que compõem a corte, diante do fenômeno novo da informação/desinformação viral, abandonaram a postura reativa que caracteriza a justiça eleitoral brasileira, marcada pelo minimalismo judicial (a vontade soberana do eleitor), em prol de atuação caracterizada como profilática, decidiram de forma monocrática em 93% dos casos (contra média de 66% em processos com outra temática), foram mais ágeis na conclusão dos processos, decidindo 71% deles antes de encerradas as eleições (frente à média histórica de 66%), atuaram sem provocação em 3% dos processos (o próprio TSE inaugurou processo sem iniciativa de terceiro), distanciando-se do princípio da inércia de jurisdição, algo de raro precedente nos tribunais brasileiros e reeditaram debates sobre a liberadade de expressão e a censura.

Abstract: Smartphones and the internet, both popularized in the early 21st century, have bestowed the traits of instantaneity and ubiquitousness to the digital world, allowing information to traverse the globe in a flash. Through these channels, marked by their great speed and reach, disinformation, best exemplified in modern times by use of the term ?fake news?, flows without impediment and with the power to influence politics, economics, culture, health care, health policies, as well as other aspects of human relations. This phenomenon, which can translate into the possibility of spreading fake content on a massive scale, has sparked debates regarding the use of censorship on the world wide web, which could be implemented through the use of tools and software designed to mine data in great quantities, especially in non-structured environments such as social networks and messaging apps, all this in order to root out manufacturers of disinformation, as well as how it is shared and boosted. The reflections of these opposing actions (information, disinformation, and censoring) which slide into the concepts of freedom of expression, coercion, and dominion deserve to be meticulously examined. The research revealed that the judges of the TSE (Electoral Superior Court), faced with the novel phenomenon of viral information/disinformation, departed from the reactive stance that characterizes Brazilian electoral justice, marked by minimalism (the sovereign will of the voter), in favor of a proactive approach. They decided monocratically in 93% of cases (compared to an average of 66% in cases with other themes), and were more expeditious in concluding proceedings, deciding 71% of them before the close of elections (against the historical average of 66%), and acted without provocation in 3% of cases (the TSE itself initiated proceedings without a third-party initiative), distancing themselves from the principle of jurisdictional inertia; a rare precedent in Brazilian courts.