Morfoanatomia de três espécies de Cyperaceae ocorrentes em restinga: com ênfase nos traços funcionais

Abstract

O ambiente de restinga apresenta diversos fatores limitantes que impõem estresse aos organismos, portanto, a vegetação pode apresentar características distintas relacionadas aos diferentes gradientes ambientais físico-químicos. Tais características são chamadas de adaptações ou estruturas especializadas, que funcionam como sinais (traços ou atributos) indicando como as comunidades de plantas respondem aos mesmos. Cyperaceae é a 3ª maior família entre as monocotiledôneas com cerca de 90 gêneros e 5.600 espécies, é cosmopolita de significado econômico e ecológico globais, sendo uma das famílias mais representativas em estudos de levantamento florístico em ambientes de restinga. Desta forma, as espécies Cyperus ligularis, Rhynchospora holoschoenoides e Scleria distans, representativas nas restingas de Santa Catarina, foram coletadas no Parque Natural Municipal das Dunas da Lagoa da Conceição em baixadas alagadas e baixadas secas, a fim de investigar possíveis variações morfoanatômicas relacionadas com os diferentes ambientes. Foram selecionados em média dez indivíduos adultos para cada ambiente, mensurados o comprimento do escapo floral, massa fresca e massa seca foliar, área da lâmina foliar, área específica foliar, grau de suculência foliar, altura e espessura da parede periclinal externa das células epidérmicas do escapo floral e da folha, proporção de aerênquima do escapo floral, densidade estomática foliar, número de camadas da epiderme de C. ligularis, área das lacunas de aerênquima foliares, espessura do parênquima clorofiliano foliar e espessura total do limbo foliar. Os dados foram analisados estatisticamente por meio da Análise de Variância Univariada (ANOVA) e post hoc pelo teste de Tukey com nível de significância de 5%. Os resultados indicam que morfologicamente R. holoschoenoides e S. distans tem maior desenvolvimento na baixada alagada possivelmente pela ação do etileno, que alonga a folha e o escapo proporcionando maior contato com a atmosfera, melhorando as trocas gasosas e a captação de energia luminosa fazendo com que a planta se desenvolva melhor e C. ligularis tem melhor desenvolvimento na baixada seca por possivelmente ser menos sensível aos níveis de etileno, não tolerando altos níveis de alagamento. Com relação aos dados quantitativos anatômicos, as espécies mostram adaptações distintas, de modo geral, na baixada seca em R. holoschoenoides e S. distans destacamos maior densidade estomática e maior altura das células epidérmicas adaxiais. Na baixada alagada nas três espécies destacamos maior altura das células epidérmicas abaxiais, maior espessura da parede periclinal externa em ambas as faces, maior número de camadas e maior altura das células da epiderme múltipla de C. ligularis. Destacamos ainda presença de aerênquima, células buliformes, idioblastos com compostos fenólicos, parênquima amilífero no rizoma principalmente em R. holoschoenoides na baixada seca, e anatomia Kranz e epiderme múltipla em C. ligularis. Concluímos que as espécies aqui analisadas apresentam adaptações para ambos os ambientes, baixadas secas e alagadas apresentando diferentes estratégias para enfrentar os períodos de seca e alagamento.

Abstract: The restinga environment presents several limiting factors that impose stress on organisms, therefore, the vegetation may present distinct characteristics related to the different physical-chemical environmental gradients. Such characteristics are called adaptations or specialized structures, which function as signals (traits or attributes) indicating how plant communities respond to them. Cyperaceae is the 3rd largest family among monocotyledons with about 90 genera and 5.600 species, is cosmopolitan of global economic and ecological significance, and is one of the most representative families in floristic survey studies in restinga environments. Thus, the species Cyperus ligularis, Rhynchospora holoschoenoides and Scleria distans, representative of the restingas of Santa Catarina, were collected in the Parque Natural Municipal das Dunas da Lagoa da Conceição in flooded and dry lowlands, in order to investigate possible morphoanatomical variations related to the different environments. An average of ten adult individuals were selected for each environment, and the floral scape length, fresh and dry mass of the leaves, leaf blade area, specific leaf area, leaf succulence degree, height and thickness of the outer periclinal wall of the epidermal cells of the floral scape and leaf, floral scape aerenchyma proportion, leaf stomatal density, number of layers of C. ligularis epidermis, area of the gaps of leaf aerenchyma, thickness of the leaf chlorophyll parenchyma and total thickness of the leaf blade were measured. The data were statistically analyzed by the Univariate Analysis of Variance (ANOVA) and post hoc by the Tukey test with a significance level of 5%. The results indicate that morphologically R. holoschoenoides and S. distans have greater development in the flooded lowlands, possibly due to the action of ethylene, which lengthens the leaf and scape, providing greater contact with the atmosphere, improving gas exchange and capture of light energy, causing the plant to develop better, and C. ligularis has better development in the dry lowlands, possibly because it is less sensitive to ethylene levels and does not tolerate high levels of flooding. Regarding the anatomical quantitative data, the species show distinct adaptations, in the dry lowlands in R. holoschoenoides and S. distans we highlight greater stomatal density and greater height of the adaxial epidermal cells. In the flooded lowlands in the three species we highlight greater height of the abaxial epidermal cells, greater thickness of the external periclinal wall on both faces and greater number of layers and greater height of the cells of the multiple epidermis of C. ligularis. We also highlight the presence of aerenchyma, bulliform cells, phenolic compounds in the vegetative organs analyzed, starch reserves in the rhizome mainly of R. holoschoenoides in the dry lowlands, and Kranz anatomy and multiple epidermis in C. ligularis. We conclude that the species analyzed here present adaptations to both environments, dry and flooded lowlands, presenting different strategies to face periods of drought and flooding.