Abstract:
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A presente dissertação discute a doutrina cartesiana das paixões. Num primeiro momento, com o objetivo de compreender o contexto em que esta discussão está inserida, apresentamos a tese dualista cartesiana, segundo a qual os seres humanos são compostos de corpo e alma, ambos concebidos como substâncias completamente distintas. Assim, apresentamos três argumentos para a distinção entre mente e corpo, a saber: (i) o argumento da dúvida, (ii) o argumento da percepção clara e distinta e (iii) o argumento da indivisibilidade da alma. Além disso, discutimos a noção de união substancial, já que as paixões pressupõem uma interação entre corpo e alma. A partir disso, analisamos o conceito de "paixão": investigamos a origem deste termo, salientando o sentido de passividade mantido também na perspectiva cartesiana; discutimos a definição de paixão como "percepção da alma causada pelo corpo", explorando especialmente o significado dos termos "percepção" e "causalidade"; e apresentamos os diferentes gêneros de paixão, tais como: as sensações, os apetites e as emoções. Por fim, propomos alguns questionamentos confrontando as paixões no contexto do Dualismo Cartesiano, tendo em vista as dificuldades de entender as paixões a partir da perspectiva da dicotomia físico-mental, pela qual a paixão não tem um lugar linearmente estabelecido. Desta forma, problematizamos a possibilidade das paixões neste sistema e indagamos pelo seu estatuto ontológico, considerando-as como realidades objetivas, não obstante sejam signos das coisas. Estas questões levam-nos a reconhecer a irredutibilidade das paixões a eventos puramente intelectuais ou a eventos puramente físicos. Assim, consideramos as paixões como uma terceira classe de eventos, ou seja, modos da união entre mente e corpo - por este motivo elas são fenômenos singulares no sistema de Descartes. This dissertation aims at discussing the Cartesian doctrine of passions. First, in order to understand the context of this discussion, I present the Cartesian dualist thesis, according to which human beings are composed of body and soul, both conceived of as completely distinct substances. Then, I present three arguments for the mind-body distinction, namely: (i) the argument of doubt, (ii) the argument of the clear and distinct perception, and (iii) the argument of the indivisibility of the soul. Moreover, I discuss the notion of substantial union, since passions presuppose an interaction between body and soul. Given those first points, I analyze the concept of "passion": I investigate the origin of this term, stressing the sense of passivity it has according to the Cartesian view; I discuss also the definition of "passion" as "a perception of the soul caused by the body", notably exploring the meaning of terms such as "perception" and "causality"; and I discuss different sorts of passions, such as sensations, appetites, and emotions. Finally, I raise some questions as to passions in the context of Cartesian dualism, considering the difficulties to understand passions from the point of view of the physical-mental dichotomy, according to which a passion is not given a place easily. So, I discuss the possibility of passions in this system and ask for its ontological status, considering them as objective realities, even though they are signs of things. These questions lead me to recognize the irreducibility of passions to strictly intellectual events or to strictly physical events. Thus, I take passions as a third class of events, i.e. modes of union between mind and body - that's why they are unique phenomena in Descartes' system. |