"Fuga do mundo": as críticas de Hannah Arendt ao individualismo no mundo moderno

Abstract

Tomou-se como objetos centrais para a pesquisa aqui disposta as obras A Condição Humana (1958) e A Vida do Espírito (1977) de Hannah Arendt para satisfazer o objetivo principal de compreender o lugar do indivíduo no republicanismo de Arendt e explorar as características do individualismo e suas consequências na sociedade moderna. Parte do nosso trabalho foi interpretar o significado que Arendt deu a termos políticos, por essa razão, a hermenêutica foi a metodologia apropriada na compreensão da autora. Em adição a essa metodologia, foi preciso a utilização do contextualismo histórico para reduzir os impactos da experiência da pesquisadora na interpretação das obras. Dessa maneira, foi possível investigar as tradições de pensamentos as quais Arendt é usualmente associada, além de propor uma discussão detalhada sobre o conceito de liberdade, na medida que influencia seu entendimento de participação do indivíduo na sociedade. Além disso, pudemos caracterizar o conceito de mundo, muito importante para entendermos porque a “fuga do mundo” é uma ameaça a moderna democracia. As principais características do individualismo em Hannah Arendt são cinco: 1 – voluntariedade, pois é uma escolha política de se isolar do mundo; 2 – desprezo pelos direitos humanos, como forma de negar a certos indivíduos o pertencimento ao mundo; 3 – perda do senso comum e alienação, no gradual processo de isolamento, os indivíduos vão perdendo a capacidade de avaliar a realidade; 4 – futilidade, pois a escolha de abrir mão da participação pública para perseguir objetivos pessoais, segundo a autora é frívolo e, por último, mas não apresenta real ameaça ao mundo, 5 – a retirada do mundo, diferentemente de fuga do mundo, a retirada é uma ação necessária para a reflexão e condição essencial de garantia da pluralidade, antítese do individualismo enquanto ameaça ao mundo comum. O individualismo não é um cultivo da individualidade, ou o desenvolvimento de nossas aspirações pessoais, o individualismo do qual nos referimos é a escolha individual de isolar-se a tal ponto que a vida pública não apresenta nenhum significado para o indivíduo. A grande ameaça a que Arendt teme é a geração de um vazio político, causado pelo individualismo, com a tendência de ser ocupado por uma força externa e autoritária. A nossa única forma de resistir a isso é criando meios para proteger a pluralidade. Como antítese do individualismo, a pluralidade é a característica essencial de quase todos os elementos constitutivos da política.

Hannah Arendt’s works The Human Condition (1958) and The Life of the Spirit (1977) were taken as the central objects for this research, in order to satisfy the main goal of comprehending the place of the individual in Arendt’s republicanism and exploring the characteristics of individualism and its consequences in modern society. Part of our job was to interpret the meaning of political terms given by Arendt, which is why hermeneutics was the appropriate methodology to understand the author. In addition, it was necessary to use historical contextualism to reduce the impact of the researcher’s experience on the interpretation of the books. Therefore, it was possible to investigate the traditions of political thought with which Arendt is usually associated, in addition to proposing a detailed discussion of the concept of freedom, insofar as it influences her understanding of the individual’s participation in society. That way, we were able to characterize the concept of “world”, which is important as a way to understand the reasons why the “escape from the world” is a threat to modern democracy. The main characteristics of individualism found in Arendt’s work are five: 1 - voluntariness, because it is a political choice to isolate oneself from the world; 2 – the despise for human rights, as a way of denying certain individuals their feeling of belonging to the world; 3 - loss of common sense and alienation, in the gradual process of isolation, individuals lose their ability to evaluate reality; 4 - futility, because the choice to give up public participation to pursue personal goals, according to the author, is frivolous and, lastly, but does not present a real threat to the world, 5 - withdrawal from the world, unlike escape from the world, withdrawal is a necessary action for reflection and an essential condition for guaranteeing plurality, the antithesis of individualism as a threat to the common world. Individualism is not a cultivation of individuality, or the development of our personal aspirations, the individualism we are referring to is the individual choice to isolate oneself to such an extent that public life has no meaning for the individual. The great threat that Arendt fears is the generation of a political vacuum, caused by individualism, with the tendency to be occupied by an external, authoritarian force. Our only way of resisting this is by creating means to protect plurality. As the antithesis of individualism, plurality is the essential characteristic of almost all the constituent elements of politics. .