Comportamento adaptativo, cognição e sintomatologia em pré-escolares com transtorno do espectro autista

Abstract

O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição do neurodesenvolvimento caracterizada por alterações cognitivas e comportamentais, incluindo dificuldades significativas na interação e comunicação social, impactando o comportamento adaptativo. Déficits em Teoria da Mente (ToM) e disfunções executivas são hipóteses existentes para explicação dos sintomas. Diante disso, a presente pesquisa objetivou investigar as relações entre cognição, com ênfase em funções executivas (FE) e ToM, sintomas e comportamento adaptativo em crianças pré-escolares com TEA. Linguagem e inteligência foram inseridas nas análises para maior compreensão do perfil dos participantes e relações entre os construtos. A amostra incluiu 35 crianças com TEA entre 3 e 6 anos (M = 66,8 meses; DP = 10,15). Foram aplicados: Questionário de fatores de saúde, sociodemográficos e culturais para avaliação neuropsicológica infantil (QNP-inf); Escala de Responsividade Social (SRS-2); Sistema de Avaliação de Comportamento Adaptativo (ABAS-3); Teste de Teoria da Mente para Crianças (TMEC); Desafio da Ordenação de Cartões por Dimensões (DOC); Tarefa Span de Blocos ? Corsi (TSB-C); Tarefa Span de Dígitos (TSD); NEPSY-II - Substeste Estátua; Protocolo de Observação Comportamental (PROC); SON-R 2½-7 [a]. Foram conduzidas análises não-paramétricas. Os instrumentos de desempenho que avaliaram habilidades linguísticas receptivas e expressivas apresentaram correlações positivas com tarefas de ToM, flexibilidade cognitiva e memória de trabalho visuoespacial. Além disso, os desempenhos nas medidas de inteligência também se correlacionaram com ToM, flexibilidade cognitiva e memória de trabalho, tanto auditiva quanto visuoespacial. Correlações significativas foram observadas entre ToM e FE, considerando as pontuações brutas de flexibilidade, memória de trabalho e controle inibitório. No entanto, o desempenho nas tarefas de ToM não apresentou correlação significativa com os escores da escala de relato envolvendo comportamento adaptativo. Apenas a memória de curto prazo auditiva mostrou associação com o domínio conceitual dessa escala, assim como a inteligência. O desempenho em memória de trabalho visuoespacial foi a única associada à frequência de sintomas de TEA relatada pelos responsáveis, porém essa relação foi inversa ao esperado. Em contrapartida, a frequência de sintomas de TEA apresentou correlações negativas com o comportamento adaptativo, indicando que, entre as crianças participantes, maiores frequências de sintomas estiveram associadas a menores habilidades de raciocínio, resolução de problemas, desempenho acadêmico, interação social, autonomia e autocuidado, de acordo com dados preenchidos pelos responsáveis. Por fim, foram identificadas diferenças significativas entre meninos e meninas em relação à ToM, memória de trabalho visuoespacial, inteligência e frequência de sintomas de TEA, com os meninos apresentando melhor desempenho em tarefas cognitivas, mas também maior frequência de sintomas de autismo relatados pelos responsáveis. Os resultados destacam a heterogeneidade do TEA e as relações complexas entre comportamento adaptativo, cognição e sintomas em pré-escolares. Isso reforça a importância de uma abordagem integrada no planejamento terapêutico, considerando múltiplos fatores e diferentes formas de avaliação.

Abstract: Autism Spectrum Disorder (ASD) is a neurodevelopmental condition characterized by cognitive and behavioral alterations, including significant difficulties in social interaction and communication, which impact adaptive behavior. Deficits in Theory of Mind (ToM) and executive dysfunctions are among the existing hypotheses to explain these symptoms. In this context, the present study aimed to investigate the relationships among cognition?with an emphasis on executive functions (EF) and ToM?symptoms, and adaptive behavior in preschool children with ASD. Language and intelligence were included in the analyses to provide a deeper understanding of the participants? profiles and the interrelations among constructs.The sample comprised 35 children with ASD aged between 3 and 6 years (M = 66.8 months; SD = 10.15). The following instruments were administered: Child Neuropsychological Assessment Questionnaire for Health, Sociodemographic, and Cultural Factors (QNP-inf); Social Responsiveness Scale, Second Edition (SRS-2); Adaptive Behavior Assessment System, Third Edition (ABAS-3); Theory of Mind Test for Children (TMEC); Dimensional Change Card Sort (DCCS); Corsi Block-Tapping Task (TSB-C); Digit Span Task (TSD); NEPSY-II ? Statue Subtest; Behavioral Observation Protocol (PROC); and SON-R 2½?7 [a]. Non-parametric analyses were conducted. Performance-based measures assessing receptive and expressive language abilities were positively correlated with ToM tasks, cognitive flexibility, and visuospatial working memory. Intelligence scores were also positively correlated with ToM, cognitive flexibility, and both auditory and visuospatial working memory. Significant correlations were found between ToM and EF measures, particularly raw scores on flexibility, working memory, and inhibitory control. However, ToM task performance was not significantly correlated with the adaptive behavior scale scores. Only auditory short-term memory showed an association with the conceptual domain of this scale, as did intelligence. Visuospatial working memory was the only domain significantly associated with the frequency of ASD symptoms reported by caregivers, although this relationship was inverse to what was expected. Conversely, the frequency of ASD symptoms was negatively correlated with adaptive behavior, indicating that among the participating children, higher symptom frequencies were associated with lower skills in reasoning, problem-solving, academic performance, social interaction, autonomy, and self-care, according to caregiver reports. Finally, significant differences were found between boys and girls in ToM, visuospatial working memory, intelligence, and frequency of ASD symptoms, with boys demonstrating better cognitive performance but also higher caregiver-reported autism symptoms. These findings highlight the heterogeneity of ASD and the complex relationships among adaptive behavior, cognition, and symptoms in preschool-aged children. They underscore the importance of an integrated approach to therapeutic planning, taking into account multiple factors and diverse forms of assessment.