"Explosão discursiva" na câmara dos deputados: uma análise dos projetos de lei sobre o aborto no contexto neoliberal e neoconservador brasileiro (2019-2020)

Abstract

Essa dissertação tem como objetivo analisar como o aborto é colocado em discurso entre os anos 2019 e 2020 na Câmara dos Deputados e quais os enunciados discursivos que legitimam a sua proliferação em um contexto demarcado pela racionalidade neoliberal e neoconservadora. Essas racionalidades produzem um ideal privatista e familista que impacta os corpos feminizados. O Direito, diante desse contexto, constitui arena e estratégia para restauração do ideal de família (re)produtiva, inerentes às intersecções entre o neoliberalismo e o neoconservadorismo que impactam as percepções sobre a interrupção voluntária da gravidez. Essa intersecção é uma das condições de possibilidade que produzem a prática discursiva sobre o aborto na Câmara Federal. Por meio da Teoria Fundamentada nos dados e pelas contribuições de Michel Foucault sobre o discurso foram analisados 23 projetos de lei na tentativa de compreender quais são os enunciados discursivos que compõem o léxico parlamentar e as suas articulações na produção de significados sobre o aborto na Câmara dos Deputados. Os parlamentares e as parlamentares que apresentaram os Projetos de Lei à Câmara dos Deputados também foram estudados nesta dissertação a fim de verificar como se constituem enquanto sujeitos discursivos taticamente situados. As articulações de determinados parlamentares com o Governo Executivo perpassaram a análise assim como a reação de alguns grupos frente às ações do Governo Federal. Por fim, conclui-se que os enunciados discursivos sobre o aborto transitam entre a moralização dos corpos feminizados e a linguagem dos direitos sexuais e reprodutivos na Câmara dos Deputados. As racionalidades neoliberal e neoconservadora não somente dão as bases para os projetos contrários, mas também integram alguns projetos lidos na chave dos favoráveis ao aborto. Ainda que haja alguns focos de resistência por parte de deputadas feministas, a propositura legislativa se baseia em conter o retrocesso e garantir o que já é permitido por lei.

Abstract: This dissertation aims to analyze how abortion is put into discourse between the years 2019 and 2020 in the House of Representatives and what discursive statements legitimize its proliferation in a context demarcated by neoliberal and neoconservative rationalities. These rationalities produce a privatistic and familistic ideal that impacts feminized bodies. Law, in this context, constitutes an arena and strategy for the restoration of the (re)productive family ideal, inherent to the intersections between neoliberalism and neoconservatism that impact perceptions about voluntary interruption of pregnancy. This intersection is one of the conditions of possibility that produce the discursive practice on abortion in the Federal Chamber. Through Grounded Theory in the data and Michel Foucault's contributions on discourse, 23 bills were analyzed in an attempt to understand which discursive statements make up the parliamentary lexicon and their articulations in the production of meanings about abortion in the House of Representatives. The parliamentarians who presented the Bills to the House of Representatives were also studied in this dissertation to verify how they constitute themselves as tactically situated discursive subjects. The articulations of certain deputies with the Executive Government permeated the analysis, as well as the reaction of some parliamentary groups to the actions of the Federal Government. Finally, we conclude that there is moralization of feminized bodies and the language of sexual and reproductive rights in the discursive construction about abortion in the House of Representatives. The neoliberal and neoconservative rationalities not only provide the basis for opposing projects, but also integrate some projects read in the key of those favorable to abortion. Although there are some pockets of resistance by feminist deputies, the legislative proposal is based on containing the regression and guaranteeing what is already allowed by law.