Abstract:
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O Futebol atravessa o século XX e é atravessado por ele. Espaço de prestígio
exclusivo das elites, chega ao Brasil no rebuliço do começo do século, poucos anos
após a abolição da escravatura no país. O futebol, como tudo na vida, não se
encontra à margem disso. Entendido como elemento regenerador, foi utilizado para
validar os discursos racistas de melhoria da raça. Entendida a importância do
referido esporte, foi utilizado como plataforma de promoção dos discursos
nacionalistas de harmonia social. Com a conquista da Copa do Mundo de 1958 e a
consolidação de um estilo próprio de jogar, o futebol-arte, o esporte rompe com as
barreiras raciais que impunham ao negro um lugar de subordinação na hierarquia
social do país. A importância do rádio na equação, sobre quem joga, quem escuta
ou assiste. O futebol é o lugar do protagonismo, da identificação, da participação
ativa. Do engajamento convicto, da autonomia plena. Não é uma ferramenta, é uma
linguagem. Não é um passatempo, é um universo. É na prática que o jogo foi se
ressignificando até se tornar o que é hoje: espaço de encantamento, da beleza, de
ruptura, do inesperado sublime. Local do acaso, do sobrenatural, do inexplicável.
Lugar onde a população brasileira se realiza e se expressa com excelência, onde
somos respeitados por sermos aquilo que de fato somos. Onde não precisamos
pedir licença para passar, onde ninguém nos olha de cima. Este estudo, oriundo de
pesquisa bibliográfica, aborda o futebol em suas inúmeras expressões. É a essência
da prática aquilo que nos interessa, seu substrato. Mas é o submundo do jogo
aquilo que se impõe: sua matriz espetacularizada busca determinar ao jogar um
horizonte seco, escasso, onde os campinhos viraram condomínios, as ruas se
tornaram hostis; onde o prazer fora substituído pelo dever e as imposições
mercadológicas se tornaram o norte, um viralatismo repaginado, quanto iremos
lucrar com determinado jogador, qual será o bilionário que se utilizará dos nossos
clubes enquanto joguete. A vitória a qualquer preço, a derrota que não ensina, o
lucro acima de todos. Como se fosse uma vontade autêntica estampar no peito as
marcas de um mundo globalizado que se esqueceram de nos incluir. Não por acaso,
o jogador brasileiro se insere no lamaçal de inoportunidades que o modo de
produção capitalista impõe aos jovens que nascem nos países periféricos do globo.
A esperança coletiva de ascensão social, o discurso meritocrático que não
comporta, tampouco explica, mas que visa associar o esporte aos valores
dominantes, como se tudo fosse um grande aprendizado e o sofrimento no final das
contas tenha valido a pena. |