Tecnologia, racismo e branquitude: um olhar sobre compreensões docentes e possibilidades para um ensino sobre tecnologia no Brasil

Abstract

Qual tem sido, historicamente, o papel da educação científica e tecnológica no Brasil? Qual é a função desse tipo de conhecimento na etapa básica de educação? É relevante falar sobre tecnologia no ambiente escolar ou recursos tecnológicos servem apenas como meio didático? Como aproximar um ensino sobre tecnologia dos debates sobre as questões étnico-raciais? Partindo dessas reflexões, este trabalho busca abordar a importância de fomentar, no âmbito da educação básica, um ensino sobre tecnologia que inclua a perspectiva étnico-racial. Sendo assim, como forma de buscar aproximações entre essas duas áreas, a pesquisa foi dividida em dois momentos. Primeiramente, realizou-se uma pesquisa na Biblioteca Digital Brasileira de Teses e Dissertações (BDTD) para encontrar trabalhos contendo abordagens sobre tecnologia e/ou educação para as relações étnico-raciais no contexto do ensino de ciências. Nessa etapa, a pesquisa realizada encontrou trabalhos que tratam da necessidade de se fomentar um ensino sobre tecnologia mais robusto na educação básica, com rico referencial teórico e pluralidade de abordagens. Todavia, apenas um dos trabalhos encontrados contemplava a temática étnico-racial em associação à educação tecnológica, trazendo possibilidades para um ensino sobre tecnologia, ainda que de modo incipiente. Sendo assim, de modo a buscar mais elementos para essa construção, em um segundo momento foram realizadas entrevistas com professores e professoras de duas instituições de ensino: uma Escola de Educação Básica da Grande Florianópolis e de um Instituto Federal do estado de Santa Catarina. A análise das entrevistas foi orientada pelos pressupostos da Análise Textual Discursiva (ATD) e indicou que, de modo geral, as professoras e professores demonstram ter conhecimentos sobre as implicações do racismo sobre a população negra e também sobre as vantagens sociais de ser branco/a. Todavia, pouco se falou sobre as populações indígenas, de modo que parece haver uma dificuldade de compreender como o racismo afeta estas populações. Ainda, parece haver pouca implicação ativa dos entrevistados e entrevistadas em ações de combate ao racismo ou de inserção desses debates em sala de aula. No que se refere à tecnologia, os professores trazem uma grande variedade de possibilidades para se pensar sobre o tema, entretanto há poucas propostas para aproximar um ensino sobre tecnologia do debate étnico-racial. Compreende-se que o ambiente embranquecido do corpo docente de ambas instituições dificulta a aproximação com as questões étnico-raciais ou mesmo com as implicações negativas do avanço tecnológico. Assim, o conceito de branquitude foi mobilizado como forma de evidenciar possibilidades para que pessoas brancas possam atuar de modo implicado na luta contra o racismo e na busca por maior justiça racial. Nesse sentido, superar a fragilidade e o medo branco surge como um desafio fundamental para que professores e professoras brancas possam se inserir no debate étnico-racial a partir do seu lugar racial e, assim, construir caminhos para uma prática antirracista. Por fim, ressalta-se que a promoção de um ensino sobre tecnologia que contemple as questões étnico-raciais é uma forma de possibilitar um acesso a outras visões de mundo, associadas a compreensões alternativas sobre avanço social e desenvolvimento.

Abstract: What has been, historically, the role of scientific and technological education in Brazil? What is the function of this type of knowledge in basic education? Is it relevant to discuss technology in the school environment, or do technological resources merely serve as teaching aids? How can we bring the teaching of technology closer to discussions about ethnic-racial issues? Based on these reflections, this work seeks to address the importance of promoting, within basic education, an approach to technology that includes an ethnic-racial perspective. To create connections between these two areas, the research was divided into two stages. First, a search was conducted in the Brazilian Digital Library of Theses and Dissertations (BDTD) to find studies addressing technology and/or education for ethnic-racial relations within the context of science education. In this stage, the search found studies highlighting the need to foster a more robust approach to teaching technology in basic education, with a rich theoretical framework and diverse approaches. However, only one of the studies addressed ethnic-racial issues in connection with technological education, offering possibilities for teaching technology, though in a limited way. Therefore, to gather more elements for this framework, in a second stage, interviews were conducted with teachers from two educational institutions: a Basic Education School in Greater Florianópolis and a Federal Institute in the state of Santa Catarina. The analysis of these interviews was guided by the principles of Discursive Textual Analysis (DTA) and indicated that, in general, the teachers are knowledgeable about the implications of racism for the Black population as well as the social advantages of being white. However, Indigenous populations were scarcely mentioned, suggesting a difficulty in understanding how racism affects these groups. Additionally, the participants seem to have limited active involvement in actions to combat racism or in integrating these discussions into the classroom. Regarding technology, teachers offer a wide range of perspectives on how to address the topic, but there are few suggestions for connecting the teaching of technology to ethnic-racial discussions. It is understood that the predominantly white teaching staff in both institutions hinders engagement with ethnic-racial issues or even with the negative implications of technological progress. Thus, the concept of whiteness was used to highlight ways in which white individuals can actively engage in the fight against racism and strive for greater racial justice. In this sense, overcoming white fragility and fear emerges as a fundamental challenge for white teachers to participate in ethnic-racial discussions from their racial standpoint, thereby paving the way for anti-racist practices. Finally, it is emphasized that promoting technology education that addresses ethnic-racial issues can provide access to alternative worldviews and different understandings of social advancement and development.