Repressão, violências e sofisticação do controle: análise descolonial da criminalização dos movimentos populares do campo na Região Sul do Brasil

Abstract

A pesquisa se propõe a compreender as estratégias contemporâneas de repressão e controle direcionadas aos movimentos populares do campo, a partir de uma perspectiva descolonial. Parte-se da compreensão das violências produzidas pela modernidade e colonialidade do poder, a fim de analisar a forma pela qual se construíram as relações agrárias no Brasil. Com esse aporte, a criminologia crítica, amparada nas teorias latino-americanas, serve a ampliar o reconhecimento dos instrumentos limitantes da organização popular e territorial, concebendo-os a partir do Direito, mas também nas dinâmicas que repreendem a expansão da autonomia dos grupos organizados em torno das demandas fundiárias. Para que fosse possível a verificação dessas relações, foram realizadas treze entrevistas em profundidade com advogadas e advogados populares e defensora pública atuantes com movimentos populares do campo na Região Sul do Brasil. Os dados foram analisados por meio da Teoria Fundamentada nos Dados, que possibilitou a sistematização das informações a fim de traçar paralelo com o aporte teórico. Dessa relação emergem impressões sobre a precariedade do alcance da Justiça pelas instituições, no que toca ao assunto tratado, bem como a distinção de seis eixos de criminalização dos movimentos populares do campo: 1) repressão física, 2) imaginário do medo, 3) criminalização do CNPJ, 4) genocídio por gotejamento, 5) revitimização pelas vias legais, e 6) sofisticação do controle. A interseção entre as formas de criminalização expostas nos eixos é dinâmica e, quando incidem nas decisões judiciais, apontam a existência do lawfare do campo, como a sucessão de modelos repressivos direcionados aos integrantes dos movimentos do campo que culminam em posicionamentos jurídicos desfavoráveis à atuação.

Abstract: The research aims to understand the contemporary strategies of repression and control directed to popular movements located in brazilian countryside, following a descolonial perspective. The paper starts with the understanding of the violence produced by the modernity and coloniality in order to analyze the way in which agrarian relations were built in Brazil. The critical criminology, supported by Latin American theories, serves to broaden the recognition of the limiting instruments of popular and territorial organization, conceiving them beyond the Law, in all the dynamics that rebuke the expansion of the autonomy of groups organized around territorial demands. In order to verify these relationships, thirteen interviews were carried out with lawyers and a public defender that work with popular movements from the countryside in the South Region of Brazil. The information collected from the interviews were analyzed using the Grounded Theory, which enabled the systematization of information in order to draw parallels with the theoretical contribution. From the research impressions about the precariousness of the reach of Justice by the institutions emerged, regarding the subject discussed, but also distinguishing six axes of criminalization of popular movements in the countryside, which are: 1) physical repression, 2) imaginary of fear, 3) criminalization of the National Registry of Legal Entities, 4) drip-drip genocide, 5) revictimization through legal channels, and 6) sophistication of control. As a conclusion, the research affirms that the intersection between the forms of criminalization exposed in the axes is dynamic and, when they affect judicial decisions, it is possible to check the existence of rural lawfare, such as the succession of repressive models to the members of rural movements that culminate in legal positions that are unfavorable to action.