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Este trabalho parte do tema Religião e Surdez. Considerando a escassez de estudos que apresentem olhares dos próprios surdos e realcem o papel assumido por cada língua presente nos encontros com ouvintes, espera-se estabelecer discussões que se afastem das representações dos surdos como “deficientes” e atentem para as relações de poder existentes. Focaliza-se a participação desses grupos em um contexto religioso caracterizado pelo multilinguismo, no qual, inserem-se a escrita, a leitura e os conhecimentos matemáticos, embora estes últimos não sejam aqui destacados. Reconhecendo que mesmo fora da escola as pessoas envolvem-se com variados tipos de conhecimentos, acredita-se que tratar das práticas de letramento na igreja, com toda dificuldade teórico-metodológica que isso representa, é cada vez mais necessário e apropriado, especialmente porque, no que concerne à realidade brasileira e seus estudos, eventos religiosos geralmente são preteridos aos eventos escolares. Assim, percebendo o contexto religioso como lócus privilegiado para ensino-aprendizagem e para construção de identidades e territorialidades, investigam-se representações suscitadas e posicionamentos assumidos/contestados, principalmente diante das opções linguísticas realizadas nas práticas consideradas, utilizando como suporte as pistas interacionais de Wortham (2001). A pesquisa, de cunho etnográfico (ERICKSON, 1984; 1989), segue uma abordagem qualitativa e interpretativista, situa-se na Linguística Aplicada em sua vertente INdisciplinar (MOITA LOPES, 2006b) e Transgressiva (PENNYCOOK, 2006) e desenvolveu-se com um trabalho de campo realizado de maio/2011 a julho/2013, em uma paróquia católica de Campinas-SP, por meio de observação-participante da Pastoral dos Surdos que nela se abriga. O corpus para a análise – que surge desse processo – inclui notas de campo, conversas informais, entrevistas gravadas em áudio/vídeo, diário retrospectivo, considerando também trocas que se deram por meio de mensagens de e-mail, celular e em redes sociais como o Facebook e sites como o You Tube. A discussão teórica orienta-se por autores como Bauman (2003), Cavalcanti (2006), Cuche (2002), Haesbaert (2008), Hall (1997), Maher (2010a), Moita Lopes (2012), Perlin (2004), Santana (2007), Santos (2008), Silva (2007), Street (2012), Strobel (2008), Stumpf (2007), Woodward (2000) e, abrange conceitos como letramentos, comunidades,culturas, identidades, territorialidades, representações e posicionamentos. A análise indica que o contexto, pensado inicialmente para evangelização, também é utilizado para socialização e organização política. Nesse espaço, surdos e ouvintes posicionam-se e são posicionados hierarquicamente seguindo representações sobre suas manifestações linguísticas, resultando em diferentes formas de participação nas atividades e no acesso (ou não) a determinados territórios. Das diversas práticas de letramento, surge a necessidade de familiarização com diferentes línguas, com conhecimentos em torno da leitura e da escrita, mas também com o uso das novas tecnologias e com modos particulares de atuação na igreja, para serem considerados membros efetivos desse grupo. Conflitos internos não dissolvem a comunidade (que precisa se proteger de possíveis ameaças externas), mas permitem o afastamento provisório/definitivo de alguns de seus membros. Enfim, pode-se afirmar que, no contato com diferentes tipos de letramento, surdos e ouvintes forjam representações sobre o que eles são e sobre o que os outros podem ser, experimentando, refutando ou ratificando diferentes identidades e territorialidades. |
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