Title: | Suplementação de ácidos graxos poli-insaturados n-3 em câncer gastrointestinal: efeitos sobre a inflamação, o estado nutricional, a composição corporal, índices prognósticos e a qualidade de vida durante o tratamento quimioterápico |
Author: | Mocellin, Michel Carlos |
Abstract: |
Introdução: O câncer pode se desenvolver em tecidos inflamados, assim como, o próprio tumor é responsável pela instalação e manutenção cíclica de um estado inflamatório. As moléculas inflamatórias secretadas por diferentes células (tumorais, do tecido subjacente e do sistema imune) atuam local e sistemicamente: em células cancerígenas promovem instabilidade gênica, ativação de vias antiapoptóticas, e, evasão da resposta imune anticâncer e da ação de agentes supressores de crescimento, além de estimular a angiogênese, contribuindo com a sobrevivência, o crescimento e a disseminação tumoral; efeitos sistêmicos incluem alterações metabólicas (resposta hepática de fase aguda, aumento da taxa metabólica em repouso e do catabolismo proteico e lipídico) e hormonais, bem como efeitos anorexígenos. Os desfechos comuns desta intrincada teia de relações incluem deterioração do estado nutricional - com perda de massa magra, menor resposta aos agentes quimioterapêuticos e aumento dos efeitos colaterais do tratamento, resultando por fim, em redução da qualidade de vida do paciente e pior prognóstico. Estudos clínicos e in vitro têm demonstrado que os ácidos graxos poli-insaturados n-3 (AGPI n-3), especialmente os ácidos eicosapentaenoico (EPA) e docosahexaenoico (DHA), exercem ação anti-inflamatória e anti-caquética, assim como são capazes de induzir a apoptose em células tumorais, podendo contribuir, desta forma, com a terapia anti-câncer. Objetivo: Avaliar os efeitos da suplementação dos AGPI n-3 sobre marcadores de inflamação, qualidade de vida, estado nutricional, composição corporal e índices prognósticos em câncer gastrointestinal. Método: Para responder o objetivo pretendido realizamos revisões sistemáticas com meta-análises e um ensaio clínico randomizado. Para a execução das revisões sistemáticas buscamos em bases de dados por ensaios clínicos controlados, realizados in vivo e em humanos, que avaliaram os efeitos da suplementação dos AGPI n-3 sobre marcadores de inflamação em câncer colorretal (CCR) ou gástrico (CG). Os estudos encontrados foram triados para elegibilidade pela análise do título e resumo, e selecionados quando preencheram os critérios de inclusão após análise do texto completo ou após contato com os autores. Os estudos elegíveis foram então avaliados quanto ao risco de vieses e tiveram dados de interesse extraídos pelos revisores. Com o auxílio do software estatístico STATA, as médias finais pós-intervenção foram combinadas e comparadas com as do grupo controle, resultando em uma medida de efeito resumo (meta-análise). O ensaio clínico randomizado (ECR), placebo controlado e triplo-cego, foi realizado com pacientes com câncer gastrointestinal, os quais foram suplementados com óleo de peixe provendo 1,55 g/dia de EPA e DHA (grupo intervenção) ou azeite de oliva extra virgem (grupo controle) durante as primeiras 9 semanas de tratamento quimioterápico. Estes, tiveram marcadores de inflamação circulantes (citocinas, prostaglandina E2 - PGE2, Proteína C reativa - PCR) determinados com o auxílio de kits comerciais; qualidade vida avaliada pela aplicação de questionários validados para esta população; composição corporal estimada por bioimpedância elétrica; estado nutricional avaliado por meio de indicadores antropométricos; e, índices prognósticos mensurados pelo cálculo da relação PCR/albumina e da razão neutrófilo-linfócito (RNL). Os dados foram analisados estatisticamente comparando os valores finais de cada grupo e as diferenças de média (calculada pela subtração do valor final pelo basal de cada paciente). Além disso, análises de significância clínica também foram consideradas.Resultados: Quanto aos estudos de revisão sistemática e meta-análise - Foram encontrados 18 estudos elegíveis realizados com CCR ou CG (nove para cada localização). Metade deles utilizaram uma fórmula imunomoduladora como fonte dos AGPI n-3, e a outra metade, utilizou óleo de peixe (oito estudos) ou AGPI-n-3 isolados (um estudo). Em apenas quatro a suplementação ocorreu concomitante a quimioterapia. As meta-análises mostraram em suas análises globais redução significativa de IL-6 e aumento de albumina com a suplementação dos AGPI n-3, tanto nos estudos com CCR, quanto nos com CG. Adicionalmente nos estudos com CG, se observou também, redução de TNF-a e aumento de pré-albumina. Todavia, destacamos que mais de 80% dos estudos incluídos estavam sujeitos a presença (confirmada ou suspeita) de algum viés metodológico. Quanto ao ensaio clínico randomizado Foram randomizados 56 pacientes para os grupos de estudo no período de março de 2015 a março de 2016, tendo perdas de seguimento variáveis (de até 30% para os desfechos primários de inflamação, qualidade de vida, estado nutricional e composição corporal) conforme o desfecho em questão. Os resultados mostraram que a suplementação dos AGPI n-3 durante as primeiras 9 semanas de quimioterapia preveniu a perda de massa magra (inferência clínica apenas) e reduziu os sintomas de náusea, vômito e perda de apetite nos 22 pacientes analisados pertencentes ao grupo intervenção, quando comparados aos 23 pacientes controles. Para as análises de marcadores inflamatórios foram considerados 40 pacientes (20 para cada grupo), e foi demonstrado que alguns subgrupos (pacientes com estágio IV e que não reduziram massa magra durante o estudo) tiveram redução (comparação intra-grupo final vs. basal ou das diferenças de médias entre os grupos) ou menores concentrações (comparação entre os grupos considerando apenas os valores finais), ao final de 9 semanas de suplementação de óleo de peixe, de diversos marcadores inflamatórios (IL-6, IL-8 TNF, PGE2, PCR). Também foi observada redução dos valores dos índices relação PCR/albumina e RNL, bem como maiores contagens de leucócitos totais, neutrófilos e linfócitos em alguns subgrupos. Conclusão: As evidências apresentadas pelas meta-análises sugerem uma potencial ação moduladora da inflamação dos AGPI n-3, haja vista que os estudos incluídos, ao serem combinados, demonstraram uma redução de mediadores pró-inflamatórios. Também foi observada alteração nas concentrações das proteínas hepáticas de fase aguda, corroborando com a redução da inflamação. Os achados do ECR também sugerem uma ação de redução da inflamação após a suplementação de 1,55 g/dia de EPA e DHA por 9 semanas, além de ação anticatabólica, repercutindo possivelmente em melhor tolerância à quimioterapia (reduzindo alguns sintomas de efeitos colaterais), melhor estado de composição corporal e menor risco indicado por índices prognósticos. Todavia, observa-se pelo ECR que são alguns subgrupos de pacientes que compartilham algumas características clínicas que se beneficiam. Abstract : Background: Cancer can start in an inflamed tissue, as well as the tumor microenvironment is responsible for the cyclical installation and maintenance of an inflammatory state. Inflammatory molecules secreted by different cells (tumor, underlying tissue and immune system) act locally and systemically: on cancer cells, they promote gene instability, activation of antiapoptotic pathways, and, evasion of the anti-cancer immune response and the action of growth suppressive agents, besides stimulating angiogenesis, contributing to survival, tumor growth and dissemination; systemic effects include hormonal and metabolic alterations (acute phase response, increased resting metabolic rate, and, protein and fat breakdown), as well as, appetite loss. The results of this changes include deterioration of nutritional status - with loss of lean mass, lower response to chemotherapeutic agents and increased side effects of treatment, promoting a worsening patient's quality of life and prognosis. Clinical and in vitro studies have demonstrated that n-3 polyunsaturated fatty acids (n-3 PUFA), especially eicosapentaenoic (EPA) and docosahexaenoic (DHA) acids, exert anti-inflammatory and anti-cachectic activity, as well as, are capable of inducing apoptosis in tumor cells, thus contributing to anti-cancer therapy.Objective: To evaluate the effects of n-3 polyunsaturated fatty acid (PUFA) supplementation on inflammatory markers, quality of life, nutritional status, body composition and prognostic indexes in gastrointestinal cancer. Methods: We made systematic reviews with meta-analysis and a randomized clinical trial to achieve the objectives. In systematic reviews we searched in several databases for controlled clinical trials performed in vivo and in humans, and, that assessed the effects of n-3 PUFA supplementation on inflammatory markers in colorectal (CRC) or gastric cancer (GC). The eligibility screening of retrieved studies was made by analysis of their title and abstract, and were selected when the inclusion criteria was fulfilled (the eligibility was guaranteed by full text analysis or by consult to the authors of the study). The eligible studies were judged about risk of bias and had data extracted by the reviewers. The mean values and standard deviation of the outcomes after n-3 PUFA supplementation were introduced in STATA software, and then, were compared with the values of the control group, in order to generate a summary measure (meta-analysis). The second design was a randomized clinical trial, triple blind, performed with gastrointestinal cancer patients, who received fish oil supplementation (intervention group) providing 1.55 g/day of EPA and DHA, or extra virgin olive oil (control group) for the first nine weeks of chemotherapy. In this RCT, before and after the supplementation period, we evaluated: inflammatory markers (cytokines, prostaglandin E2 - PGE2, C-reactive protein - CRP) using commercial kits; quality of life through the application of questionnaires validated for cancer population; body composition by the application of electrical bioimpedance; nutritional status through measurement of anthropometric indicators; and the risk provided by prognostic indexes (CRP/albumin ratio and neutrophil-lymphocyte ratio - NLR). For comparison analyzes between study groups in order to find differences in the outcomes assessed, we used appropriated statistical analysis, but also, we considered the clinical relevance of the findings. Results: Findings of the systematic reviews and meta-analysis: We found 18 eligible studies with CRC or GC (nine for each type). Half of them used an immunomodulatory formula as a source of EPA and DHA, and the other half used fish oil (eight studies) or isolated n-3 PUFA (one study). In only four studies n-3 PUFA supplementation occurred in patients receiving chemotherapy. Meta-analysis showed an effect of n-3 PUFA in reducing IL-6 and increasing albumin concentrations (global analyzes), both in CRC and GC studies. Additionally, in GC global meta-analysis, we observed a reduction of TNF-a and an increase of pre-albumin concentrations with n-3 PUFA supplementation. We alert that more than 80% of the included studies had bias confirmed or suspected. Findings of the RCT: 56 patients were randomized into the study groups at the recruitment period (march/2015 to march/2016). The follow up losses for primary endpoints (inflammatory markers, quality of life, nutritional status and body composition) were = 30% (the losses were variable according to the outcome analysed). The results showed that supplementation of n-3 PUFAs during the first nine weeks of chemotherapy prevented the loss of lean mass (clinical inference only) and reduced the symptoms of nausea, vomiting and loss of appetite in the 22 patients allocated to the intervention group, when compared to the 23 control patients. For the inflammatory biomarkers investigated, 40 patients (20 for each group) were analysed. It was shown that some subgroups (patients with stage IV cancer and who did not present loss of lean mass during the study) had a reduction (9 weeks vs. basal), or lower circulating concentrations (intervention grupo vs. control group at 9 weeks) at the end of nine weeks of fish oil supplementation, in various inflammatory markers (IL-6, IL-8 TNF, PGE2, CRP). We also observed a reduction of CRP/albumin ratio and RNL values, as well as an increase in total white blood cell count and in the number of neutrophil and lymphocyte cells in some subgroups.Conclusion: Evidences from meta-analyzes suggests a potential action of n-3 PUFA in contributing to the resolution of inflammation, since the included studies, when combined, demonstrated a reduction of proinflammatory biomarkers. The effects on acute phase proteins (CRP, albumin and prealbumin) also corroborate with the reduction of inflammation. In the same way, the findings from RCT suggest a reducing effect of the fish oil supplementation on inflammation after nine weeks of chemotherapy, as well as an anticatabolic activity, resulting possibly in a better tolerance to chemotherapy (reducing some side effects symptoms), better body composition and lower risk indicated by prognostic indexes. However, the benefits were not observed for all patients that ingested fish oil, it seems that some subgroups of patients with gastrointestinal cancer who share some clinical characteristics experienced the benefits of fish oil supplementation. |
Description: | Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro de Ciências da Saúde, Programa de Pós-Graduação em Nutrição, Florianópolis, 2017. |
URI: | https://repositorio.ufsc.br/handle/123456789/188466 |
Date: | 2017 |
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PNTR0211-T.pdf | 2.224Mb |
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